Quando o texto abaixo foi escrito, no ano de 1950, o autor contava quinze anos de idade.
Com este "ensaio" sobre a Revolução Farroupilha, fruto de exaustiva pesquisa realizada na biblioteca do colégio onde cursava o 4o. ano do ginásio, participou de um concurso de oratória proposto pela escola, revelando-se grande orador.
A apresentação tocou a platéia que o assistia, empolgada. Não venceu, mas fez despertar em muitos, ali, naquele momento, o sentimento de orgulho de ser do Rio Grande...

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

A Revolução Farroupilha - Parte V

A investida de Caxias na presidência da província conflagrada e no comando das armas imperiais foi o primeiro ato acertado do governo imperial. A ação do futuro duque, em face dos acontecimentos, dividiu-se em duas fases: a primeira em que, como militar, seguiu o exemplo dos seus antecessores, combatendo os rebeldes; a segunda, como político, no sentido de pacificar os espíritos dos soldados da república rio-grandense. Foi ele o primeiro homem público do império, entre estadistas e generais, a compreender que, vencer os gaúchos pelas armas, além de quase impossível, importava na perda do Rio Grande pelo Brasil e, mais que isso, cooperar para o rompimento da unidade nacional.

Uma desvantagem na continuação da guerra seria perder o direito na navegação platina. Viu, também, Lima e Silva que, além da fronteira, três homens da mesma raça e trabalhados por idênticos sentimentos, apreciavam, gostosamente, o espetáculo de que era palco a terra pampeana. Eram três sombras negras que se apresentavam ameaçadoras sobre as coxilhas da pátria: Rosas, da Argentina; Oribe, do Uruguai e Francia, do Paraguai.

A gente despercebida da Corte na via nada disso. Procurava, sempre, reduzir a revolução farroupilha a um caso policial, de mero sufocamento pelas armas. Os antecedentes da luta, suas causas primárias, seu desenvolvimento, eram criminosamente relegados a plano secundário. Caxias, entretanto, atentou para tudo e esmerou-se no desempenho da missão que o deveria sagrar o maior fator da unidade nacional.

Aquela gente indomável, magnífica de bravura, rica de idealismo, que não conhecia o ouro, nem queria as vantagens da escravidão indígena ou negra, foi-se fazendo sensível às palavras que lhe iam do emissário do Brasil. Ninguém, do mesmo modo, lhes havia mostrado o perigo latente que pairava para lá da fronteira. Caxias fez as duas coisas: falou-lhes aos sentimentos e mostrou-lhes a ameaça. Esta gloriosa proclamação é uma prova: “Lembrai-vos de que a poucos passos de vós está o inimigo de todo nós; inimigo de raça e de tradição. Não pode tardar que nos meçamos com os soldados de Rosas e de Oribe; guardemos, para então, nossas espadas e nosso sangue. Vede como esses estrangeiros exultam com esta triste guerra com que nós mesmos nos estamos enfraquecendo e destruindo. Abracemo-nos e unamo-nos para marcharmos, não peito a peito, mas ombro a ombro, em defesa da pátria, que é nossa mãe comum”.

Rosas desmascara os seus instintos, oferecendo a David Canabarro auxílio em material e dinheiro: “Meus homens estão prontos para se unirem aos valentes do Rio Grande. A um simples aceno, eles transporão a fronteira e esmagarão os imperiais, combatendo pela vossa república. Quereis o meu auxílio? Ele decidirá o vosso futuro.”

A heróica resposta de Canabarro que, acima de qualquer coisa, colocava seus sentimentos de pátria, foi a vitória política de Caxias e a segurança da integridade da pátria: “Senhor, o primeiro soldado de vossas tropas que atravessar a fronteira fornecerá o sangue com o qual será assinada a paz de Piratiny com os imperiais. Acima de nosso amor à república, colocamos nosso brio e a integridade da pátria. Se puserdes agora os vossos soldados na fronteira, encontrareis, ombro a ombro, os soldados de Piratiny e os soldados do Sr. D.Pedro II.”

Pouco tempo depois, Caxias recebia, em seu acampamento, um emissário de David Canabarro, incumbido, pela república, da paz, tantas vezes proposta pelo representante do governo imperial. As condições propostas pelos republicanos e aceitas pelos imperiais, foram, além de outras, as seguintes:

1) O indivíduo indicado por nós para governador é aprovado pelo império e passará logo a presidir a província.

2) A nossa dívida nacional será paga pelo governo imperial.

3) Os oficiais da república que, pelo nosso comandante forem indicados, passarão a pertencer ao exército do Brasil.

4) Serão livres e, como tais, considerados, todos os escravos que serviram à revolução.

5) É garantida a segurança individual e de propriedade em toda a sua plenitude.

6) Nossos prisioneiros de guerra serão logo soltos e aqueles que estão fora da província serão reconduzidos a ela.

7) Os soldados da república ficarão isentos de recrutamento.

8) O governo imperial vai tratar, definitivamente, da linha divisória com o Estado Oriental.

Esse foi o preço com que o império indenizou os desmandos de seus estadistas e generais, a começar por Feijó. Para os gaúchos, a vitória moral e material assegurada pelo tratado não compensou o sacrifício do ideal republicano. Houve, entretanto, necessidade de sopitar os anseios políticos em benefício da integridade nacional, já então francamente ameaçada pela ambição da gente de além dos limites. De qualquer forma o gaúcho havia, pela vez primeira, feito ouvir a sua voz como político. O tratado, no dia 1 de março de 1845, em Ponche Verde, entre a república e o império não significou a renúncia, pelo gaúcho, da missão que se marcou, de republicanizar o Brasil. Não. Consistiu, somente, num adiamento dessa execução. O tempo haveria de provar essa verdade.

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